21.5.09

Maternidade recorded

Esta questão da professora registada num gravador a gritar heresias lembra-me quando tirámos o João da ama porque descobrimos, também num gravador, que ele não era tratado como nós achávamos.

Agora e então os mesmos pensamentos: não tenho dúvidas de que quem faz vida a tratar de crianças tem que ser capaz de digerir as suas próprias questões pessoais e ter um comportamento correcto, com a devida tolerância.

Mas minha questão não é essa, claro.

A verdade é que não tenho dúvidas de que eu própria não gostaria de me ouvir num gravador. Tenho a certeza que se pudesse rever o meu dia-a-dia num registo áudio ou vídeo, me sentiria muitas vezes embaraçada, arrependida, constrangida com o meu tom, as minhas palavras, os meus actos. Persegue-me esta culpa de fazer tantas vezes os mesmos erros, de não ser capaz de me abstrair das minhas próprias questões, tristezas, medos, cansaços, fúrias, quando estou com eles. De não usar as palavras e o tom correcto.

Os miúdos esquecem, perdoam, talvez não tanto como gostaríamos, eu própria me esforço para tentar todos os dias ser melhor mãe e pessoa. Aceitando as falhas, consolando-me com a ideia dos recomeços, tentando ser tolerante comigo própria.

O que dizer então da possibilidade de um registo ad-eternum dos meus erros, das minhas fraquezas, acessível a qualquer um, os meus filhos a apontarem-me as falhas

Vês mãe, tu também gritas

o horror de me rever, dia após dia, a acordá-los cheia de pressa

Ontem também não me deixaste escolher um brinquedo para levar para a escola, mãe

a fazer coisas que não devo porque é o mais fácil

Neste dia deixaste-me comer chocolate e não era fim-de-semana

a perder a paciência com as chamadas de atenção deles

Mãe, eu aqui só queria que me tranquilizasses e me indicasses o caminho certo

a despachá-los para a cama porque estou tão cansada

Eu só queria que me desses mais um beijinho, mãe

horror, horror.

Falhas tanto, mãe. Olha aqui, ouve aqui.

8 comments:

  1. penso tantas vezes nisso, últimamente que ando com tão pouca paciência.

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  2. muito mal comparado (ao exemplo da prof. descontrolada durante demasiado tempo seguido), mas, raios... sim, muitas e muitas vezes não ficaria orgulhosa dos meus modos se assistisse à sua reprodução... :(

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  3. Eu não comparei, querida. (Credo)

    Apenas disse que quando me deparo com estas situações, acabo sempre a pensar no que eu própria tenho a melhorar.

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  4. Ah, bom, q não se façam comparações. Credo! Q aquilo é humilhação, pura e simples. Agora, de resto, concordo. Q estas situações nos façam reflectir sobre os nossos próprios erros. Ou palavras.

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  5. Quase todos os dias me arrependo da porcaria que faço ou deixo de fazer e tenho muita, muita vergonha. Vejo-me e revejo-me e sei que o meu ponto fraco é a impaciência. Quero corrigir, quero evitar. Umas vezes consigo, outras não. Se me visse em filme sonoro ficaria certamente horrorizada, mas depois fazia porcaria outra vez.

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  6. ai Xana, às vezes é incrível como consegues pôr tão bem em palavras este tipo de angústias. tudo o que escreveste se aplica a mim também. todos os dias sinto isso que dizes, que podia ter tido tão mais paciência, podia ter sido tão melhor mãe e no dia seguinte, novamente os mesmos erros. e mesmo durante os erros, ouço uma vozinha que me diz, "lá estás tu!!" mas na altura a impaciência é mais forte que tudo o resto, o cansaço, a falta de espaço para mim etc etc etc. mas no fundo no fundo somos as melhores mãe que sabemos ser e os nossos filhos são felizes assim.

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  7. (onde anda o meu comento de ontem)

    quando disse "mal comparado" foi como uma força de expressão tipo "isso não tem nada de nada a ver, mas até tem qualquer coisa a ver"... concordo, portanto, contigo! :)

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  8. Não precisamos dum gravador, basta termos consciência que não somos perfeitas. Não somos, o mundo não é, os nossos filhos tb não são. É a vida.
    A prof. é maluca.

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